sexta-feira, 21 de novembro de 2014

Análise: Crash: No Limite (Crash, 2004)


Ficha Técnica:
Crash: No Limite / Crash (2004)
Duração: 112 minutos
Direção: Paul Haggis
Roteiro: Paul Haggis, Robert Moresco
Elenco: Sandra Bullock, Brendan Fraser, Matt Dillon, Don Cheadle, Ryan Philippe, Ludacris, Shaun Toub

O tempo. Ah, o tempo. A primeira vez que assisti Crash foi em 2007. Geralmente, eu tenho alguma dificuldade para lembrar detalhes específicos de um filme depois de um tempo. No caso deste, conseguia puxar pouquíssimas coisas pela memória. As que mais marcaram foram o fato de que eu tinha gostado do filme e a cena em que uma criança tenta proteger seu pai. Reassistindo, ainda me emocionei com a cena citada mas o restante me deixou uma péssima impressão, diferente de outrora.


O roteirista e diretor Paul Haggis (que também foi roteirista do Menina de Ouro (Million Dollar Baby, 2004)) cria um mosaico variado de personagens para tentar ligá-los através de um tema central e algumas coincidências (algo que já tinha sido feito com maestria em Magnolia (1999) de Paul Thomas Anderson). À primeira vista, essa variedade parece algo favorável à trama, pois vemos pessoas em diferentes situações e de diferentes classes sociais. Temos um policial racista (Matt Dillon), e seu parceiro (Ryan Philippe), também racista. Temos o iraniano (Shaun Toub) que sofre preconceito de um balconista (e de pessoas que assaltam sua loja), mas na primeira oportunidade, se mostra também preconceituoso. Temos o Procurador Geral de LA (Brendan Fraser) e sua esposa (Sandra Bullock), que são assaltados logo na primeira cena do filme. Após esse evento, ela também se mostra extremamente racista, e ainda tenta justificá-lo com o trauma que acaba de sofrer. Temos uma dupla de assaltantes, sendo que um deles (Ludacris) tem uma característica bem peculiar: é racista. Há também um detetive (Don Cheadle) que durante o ato sexual com sua parceira a chama de "mulher branca" e "mexicana" e ela se irrita pois os pais são de Porto Rico e El Salvador.

Perceberam que eu não citei o nome de nenhum dos personagens? Pois é, é porque isso não tem a mínima importância, o que importa mesmo é que todos são racistas. E nesse sentido, o roteiro se mostra tão raso que, mesmo tendo criados personagens tão estereotipados, ainda faz com que 95% dos diálogos que são proferidos por suas bocas tenham um único enfoque: o racismo. Chega a ser irritante a superficialidade que as cenas adquirem por focar única e exclusivamente nisso.

Vejamos o caso do iraniano. Em sua primeira participação no filme, ele está em uma loja de armas. Ele acredita que precisa comprar uma para se defender pois aconteceram assaltos em seu comércio. Na primeira noite após a compra, ele chama um chaveiro (latino) para arrumar sua porta que fora arrombada recentemente. Como a fechadura não tem conserto, este acaba realizando a substituição da mesma. O iraniano fica possesso, e acaba xingando o latino, se recusando a pagar e ainda o chama de ladrão. Aí fica a pergunta: Esse é um comportamento que devemos levar a sério, vindo uma pessoa se sentindo acuada, fora de seu país, e sofrendo com assaltos constantes em sua loja, ainda mais perante alguém que ele acha ameaçador? Sinto muito, mas não consegui comprar isso nem por um segundo. Pra fechar de maneira cômica esse arco, a loja sofre outro assalto e o representante da seguradora diz para o iraniano que o seguro não vai cobrir pois houve negligência. Para continuar o show de estereotipagens, o representante é oriental.

Com essas características, o filme vai se tornando mais previsível a cada minuto que passa. Em um momento, a personagem de Sandra Bullock sofre um acidente doméstico. Como anteriormente ela proferiu um discurso de ódio contra negros e latinos, só podemos prever que ela vai ser ajudada por algum deles. E, claro, é isso que acontece. Haggis força demais para que o Crash se torne a obra definitiva sobre o preconceito, mas acaba executando tudo de maneira tão simplória que até se seus diálogos fossem colocados em um comercial de TV, pareceriam artificiais. Em minha opinião, há inúmeras maneiras mais eficientes e sutis para se abordar esse assunto. Tentando fazer um exercício de imaginação, fiquei pensando como seria se, por exemplo, em Gravidade (Gravity, 2013) os personagens ficassem a todo minuto falando que estão no espaço. Se tornaria algo extremamente irritante, e isso vale para qualquer filme de qualquer gênero.

Ainda assim, há algumas coisas em Crash, que são dignas de elogio. A atuação do Matt Dillon é excelente, e em determinada cena em uma clínica, ele consegue demonstrar muito bem o motivo da amargura que o personagem apresenta. Outro ponto positivo é a já citada cena em que a filha protege o pai. O modo utilizado para construí-la desde o começo do filme até o seu clímax, aliado ao pânico que o momento gera, realmente é de arrancar lágrimas.

Infelizmente, Crash apresenta pequenos momentos de brilhantismo contra um mar de clichês e ideias mal executadas. Talvez se eu reassistir daqui 7 anos eu mude de opinião, mas não creio que isso acontecerá. Dos filmes que assistirei para o Especial do Mês, acho difícil que eu consiga achar algum mais decepcionante. E olha que tem Argo (2012) no meio do caminho.

Trailer:




Imagens:








0 comentários:

Postar um comentário